Jandaia

Eles chegam aos pares, todos os dias e ficam assim, conversando, debatendo e resenhando em uma língua estranha —de gringo— entre eles e tão somente entre eles.

De fora, percebe-se que cada qual vive sua vida. Aparentam ter uma grande vida íntima. Mas, essa pujante vida privada, também permite certo gregarismo entre seus semelhantes.

Ao que tudo indica, devem possuir relógios suíços pois, tudo recomeça de novo e de novo, como se esses bichanos tivessem lido e entendido a duração e a repetição bergsoniana.

Chego a conclusão que deve ser legal viver assim.

Ninguém iria repetir diariamente uma vida de servidão ou coisa parecida. Não conheço ninguém agindo assim na nossa espécie. Mas, posso tá falando besteira já que sou assim humano-manada, sindicalizado, temente a Deus.

Em verdade, existe uma pequena parte de mim, a que ainda permanece condenada e vive em tenro cárcere, que nutre certa inveja desses seres. Esse infinitésimo de mim (ainda) sente que seria uma grande fortuna que a nossa pele virasse essas penas tão esperançosas.

Esse eu sopra sossegado em meu orì que gostaria de que ele e todos os outros pedaços de mim fôssemos embora, nas asas dessa Panair Pássaro.

Ele me diz que mesmo que eu continue assim, arrotando certa força, que no final das contas, a gota d’água desse inferno de Queiroz, de Bolsonaro, de Lula, dessa mortandade de milhões de brasileiros e, desses 57 milhões de fascistas, já deu.

De um pequenino pedaço, sem ter assim tanta força aparente, esse bicho grita e vira o homem de Tiananmen Square, cabeça e tronco gigantesco, que quase bate lá na Praia da Paciência.

Corro, fico assustado e vejo que muitas partes de mim estão faltando. Não tenho mais estômago, fígado, baço, quase sem órgão algum.

E então esse homem chinês negro me diz que minha única chance daqui pra frente é virar um encantado, virar essa Jandaia que olho incessantemente.

Desesperado com tanta alucinação com tanta pasmaceira ao redor, viro um Paraquedista.

Antes que o asfalto beije as minhas fuças, algo acontece. Asas, bico e um verde enfurecido e enegrecido tomam meu corpo vazio.

E hoje eu estou aqui, comendo, bebendo e conversando com os bróders.

Lá e cá,

por aí.

longe de vocês.

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