A repetição, em muitos sentidos , pode ser encarada como algo enfadonho. Porém, gostaria de contar sobre um rito peculiar da minha pessoa que milagrosamente não possui esse costumeiro azedume que tanto falam em processos assim.
Confesso que essa repetição se faz assim, como uma sina, todo pecaminoso santo dia.
Talvez , em pura tese aqui com meus eméritos botões, isso seja assim porque é um repetir que no fundo tem sempre alguma coisa nova. Nesse zigue-zague, que sempre tem o signo do encontro, do abraçar generoso de tudo que tenho dentro com a imensidão que existe em todo esse fora e vice-versa, de uma forma inexplicável abre sempre uma frestinha de janela.
Enfim, vou deixar dessa escrita críptica.
Afinal, não tenho talento pra ser dramaturgo de novelas das oito, de manter o arco sempre em suspensão. No final das contas, o que estou querendo dizer -enquanto Nara Leão cantarola todo o lado A do seu cintilante “Opinião de Nara” (1964 – Philips Records) – é sobre o amanhecer.
No final das contas <confesso> esse texto é um mezzo palavrar – desabafo de alguém que invariavelmente perde-se dia após dia. Pouco importa se estou aqui em Salvador, lá em Macaé, em São Sebastião do Passé ou Sampa, minha lenda é sempre nadar em um tenro malbaratar.
Pra mim, qualquer cidade só conversa comigo, só demonstra quem é de fato quando eu fico ali, naquela espécie de reza estranha onde, segundo a segundo e sensualmente, eu pego <bem de leve, com jeitinho> na mão fugidia do amanhecer.
Posso viver ali, nas matas de São Sebastião do Passé com sua tradicional bruma misteriosa ou aqui <na minha favorita> que irei agir assim, com o coração falando alto enquanto permito que o meu olhar toque cada ponta generosa do que é um nascer do dia.
São tantas realidades dessa imensidão de fora que temos que ter certo cuidado, certa prudência eivada de vagareza no olhar para não esquecer de nada.
A medida que os raios banham cada esqualiforme arranha céu, cada casinha sem reboco, os pássaros vão iniciando sua jornada de tomar seu café da manhã enquanto cantam a beleza que é no fundo tudo isso, ser vivinho da silva.
E nesse esquadrinhar diário, subo um pouco os meus olhos e fico incólume e estático, construindo uma meta estética, um meta carinhar que não seja abusivo, que seja tão somente uma espécie de força de campo do agradecer.
Nesse encontro de potências de um continumm do benfazejo fico assim certo que a melhor opção é essa ventura de olhar e se perder, de esquecer de si entre a caminhada incessante das nuvens enquanto que pertinho dali daquela dança alegre, bailam <girando e girando> Urubus e suas asas lentas e cheias de sabedoria.
E nunca nada disso tudo
é igual.
Nem eu
nem esse fora
e nem o que eu viro depois que tudo isso invade
todos os outros de mim.